quinta-feira, 24 de maio de 2012

Nobreza exposta

No Brasil existem três situações que a minoria de pessoas tidas como “com conteúdo superior e humor infinitamente mais inteligente” do que o restante considera o fim dos tempos. Uma é ler e gostar de Paulo Coelho, outra é curtir música beeeeem popular e, a terceira, e talvez a que provoque ódio coletivo mais intenso é a de admirar a trajetória da Xuxa.
O irônico é que o parceiro de Raul Seixas é o autor brasileiro mais vendido no mundo, os artistas populares rendem fortunas e a apresentadora gaúcha é a personalidade mais bem-sucedida da televisão brasileira. Coincidência ou não e mais estranho ainda é observar que toda essa turma, considerada lixo pela elite preconceituosa, tem em comum a emoção com que move e atrai outros milhões de brasileiros. De idades e classes sociais variadas. Porque a energia é quase tão inexplicável como na fórmula de Física.
No último domingo, em seu polêmico e corajoso depoimento no Fantástico, Maria da Graça Meneghel não só emocionou altinhos, como também despertou mais rancor em seu séquito de inimigos raivosos e anônimos. Se um elefante incomoda muita gente, a eterna Rainha dos Baixinhos incomoda muito mais. Todas as intelectualizadas suposições de que a loira não passa de uma invenção fake e infantilóide da Rede Globo perderam força. O que vimos em massa no último domingo explica um pouco da enigmática história de vida da mãe da Sasha. Repleta de dificuldades afetivas e sexuais e uma sintonia perturbadora com criançada de várias gerações. Pura energia sem fórmula.
Achei comovente o que a Xuxa revelou e o estímulo que ela deu a todas as crianças brasileiras que possam, ainda em tempo, pedir  socorro, sem passar a vida a chorar em silêncio. Um gesto real, digno de quem honra o trono onde as mesmas crianças a colocaram. No último ano 14 mil crianças sofreram algum tipo de violência. Depois das declarações da apresentadora na Rede Globo, aumentaram em 30% o número de ligações. Foram 285 mil chamadas para o disque denúncia da Secretaria dos Direitos Humanos.
Compartilhar a dor cura, ou ninguém saberia quem foi e o que fez lá no século passado um tal de Sigmund Freud.
Com alguns anos a mais do que a Xuxa quando sofreu violência sexual, diferente de uma criança e ciente dos riscos que corria, aos 19 anos, bem na época em que descobri que príncipes andavam de skate e não só em cavalos brancos, e ainda pouco sabia sobre os pesos do amor e da vida, fui agredida fisicamente por um namorado. O Fantástico não bateria recordes de audiência ao revelar meus fantasmas em horário nobre, tampouco você está interessado neles. Mas foi tentando explicar a mim mesma o que havia me acontecido e dividindo a minha experiência que consegui espantar alguns temores internos. Na hora, também me faltou força para pedir ajuda. Também achei que a culpa podia ser minha, assim como senti muita vergonha que as pessoas soubessem e me julgassem. Exatamente como talvez você possa estar se sentindo agora aí em frente ao computador. Esperando a próxima agressão ou que algo a ilumine e a faça desejar um amanhã diferente.
Eu bem que poderia estar escrevendo tudo isso para dar um up no meu marketing pessoal ou aparecer mais, gerar comentários, enfim. Não é o meu caso, muito menos o da Xuxa.

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